Sobre saber deixar ir embora

Hoje o post é da Natalia Kelbert. Ela passou por um experiência muito dolorida com um gatinho doente que apareceu no trabalho do marido dela. Canjica, como foi chamado, a fez pensar de forma diferente sobre saber deixar ir. Vem conferir como tudo aconteceu.

“Há tempos atrás passei mais uma vez por um dos momentos mais difíceis na relação com os animais: a hora em que estamos diante de um bichinho muito doente, com aqueles olhinhos de súplica. E aí a gente não sabe se aquele olhar quer dizer “cuida de mim, estou com dor” ou “estou sofrendo, me deixe ir em paz pois já cumpri minha missão aqui na terra”.

Essa história aconteceu no ano passado e decidi contar pois acho que minha experiência pode ajudar outras pessoas a tomarem suas decisões quando também passarem por isso.

Um dia meu marido me ligou, pois havia aparecido um gatinho branco, já adulto, no trabalho dele. As pessoas deram comida e água, e um cantinho pra ele dormir. E um nome, claro: ele agora era o Canjica.

Mas ele estava muito fraquinho, parecia bem desnutrido e precisava de cuidados veterinários. Então peguei minha caixinha de transporte e levamos ele a uma clínica de emergência. Lá, ele foi diagnosticado com desnutrição severa, e se não o tivéssemos resgatado provavelmente ficaria vivo por poucos dias apenas. Compramos AD, aquela papinha hipernutritiva, que eu dava na seringa a cada 3 horas. Junto com a papinha, um coquetel de remédios para curar a inflamação na garganta, que já estava quase fechando e por isso ele tinha dificuldades pra mastigar e respirar.

O Canjica ficou hospedado na varanda da minha casa, separado dos meus gatos, e cada vez que eu ia dar os remédios ele vinha com todo o carinho do mundo. Adorava meu colo, miava, era até difícil deixar ele lá pra voltar a fazer minhas coisas. Dava uma dózinha… E ele tinha um olhar de coitadinho tão penetrante que até quem não era muito chegado em gatos, se emocionava. Mas eu só pensava que ele ia ficar gorducho e saudável, e que então valia a pena todo aquele tratamento.

Canjica quando estava hospedado na minha varanda

Canjica quando estava hospedado na minha varanda

Mas ele não melhorava, e levamos a outra clínica. E depois de um dia inteirinho de exames, veio o laudo: ele tinha um linfoma. Foi quando imaginamos que por isso ele teria sido abandonado por sua família (é muito raro encontrar um gato de rua branquinho e carinhoso como ele, então achávamos que ele tinha se perdido). Então decidimos iniciar uma quimioterapia. A sugestão da vet, que foi muito atenciosa, era de que faríamos as primeiras sessões, e se ele respondesse bem, faríamos o tratamento até o fim. Se respondesse mal, seria sacrificado, pois não fazia sentido deixá-lo sofrendo por algo que não teria cura.

Para minha alegria, ele respondeu superbem e eu já conseguia imaginá-lo gorducho e feliz em uma nova família. A essa altura ele estava hospedado na casa da minha mãe, em Petrópolis, que o levava semanalmente para as sessões de químio. Mas passado um tempo ele voltou a piorar, já não queria mais comer e perdia peso rápido. Minha mãe o levou novamente à vet, que deu a notícia que a gente já sabia, mas não queria admitir: ele não ia mais se curar, e o tratamento só fazia prolongar o sofrimento dele. Então ele tomou sua última injeção e finalmente descansou em paz.

É claro que eu chorei um bocado. Mas o que mais me entristeceu foi pensar que ficamos mais de 3 meses nessa história, enquanto eu poderia ter sido mais madura e acabado com o sofrimento dele logo no primeiro dia em que resgatei e levei à veterinária. O tempo todo eu tinha esperanças de que fosse algo mais simples e que a gente conseguiria curá-lo, mas a verdade é que eu transferi para ele essa coisa mal-resolvida que nós, humanos, temos com a morte. Ele teria passado por essa doença de um jeito muito mais sereno se eu tivesse admitido desde o início o quão grave era a situação, e tivesse poupado-o de todas essas intervenções médicas que ele nunca pediu.

É claro que em casa ele recebia todo o carinho do mundo, mas mesmo assim não canso de me perguntar: era mesmo necessário? Por que a gente simplesmente não aprende com os animais a lidar com a doença e a morte da maneira serena que eles fazem, em vez de transferir pra eles nossa insegurança e nossa prepotência de querer ser Deus?

Canjica com o bracinho raspado da químio

Canjica com o bracinho raspado da químio

Hoje em dia me conformo com a história do Canjica e sei que demos nosso melhor por ele, mas das próximas vezes em que me deparar com um animalzinho doente, seja da minha família ou resgatado, vou pensar dez vezes antes de submetê-lo a tratamentos, exames ou internações. É claro que não vou virar uma xamã que rejeita qualquer tipo de intervenção médica, mas é preciso ver se o sofrimento gerado pelos procedimentos não é maior que o da doença em si.

Minha gatinha está bem idosa: ela é surda, já está ficando magrinha e com o pêlo sem brilho, típico de gatos idosos. Mas ela passa o dia no meu colo (eu trabalho em home-office), ronrona sem parar e dorme com a gente na cama. Eu sei que a hora dela está chegando, mas prometi a mim mesma que lidarei com isso do mesmo jeito que ela: com serenidade e naturalidade. E ela sabe que será amada até o último segundo da sua vida.”

E aí, alguém já passou por uma situação igual ou parecida? Deixe seu depoimento aqui nos comentários!

Espero que tenham gostado do post de hoje!

Semana que vem a gente volta com mais dicas e cuidados pra vocês, até lá! 🐱

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6 Comentários

  1. Marco Antonio

    Eu passei algo assim com a Margarida. Após diagnosticarem que seus rins tinham parado, fizemos todo o tratamento indicado. Eu mesmo injetava o soro pelo menos duas vezes ao dia. Medicação, cuidados com a sua limpeza pois ela chegou num estagio onde não ia mais na caixa de areie. Aliás, nem se levantava e foi parando de comer. Ela mesma foi indo aos poucos. Apesar de todos os cuidados e amor ela se foi. Foram cerca de 3 meses. Apesar do veterinário dizer que ela não sofria com dores e que estávamos dando conforto a ela, não sei se faria novamente frente a um diagnóstico irreversível. Acho que judia do animal. Enfim, fiz o que achava certo na época. e não me arrependo. De qualquer forma, não é nada fácil.

    • Fabiana Xavier

      Marco Antonio muito obrigada por partilhar esse momento com a gente!
      Sabemos que é realmente algo muito delicado e as vezes nem temos uma opinião formada até passarmos por algo assim.
      Tenho certeza que a Margarida foi muito feliz ao seu lado e soube o quanto foi amada.
      Abs

  2. Nara Guedes

    Nossa eu passei por situações assim 3 vezes uma em seguida da outra,meu primeiro gato o madruguinha teve uma infecção urinária,ficou uma bola enorme na barriga dele eu levei no veterinário tratei ele chegou a ficar bem uma semana mas na outra ele piorou e teve q ser sacrificado,eu mal tinha me recuperado dessa perda é uns três meses depois meu outro gato o minhas teve o mesmo problema é eu criei esperanças q ele ia melhorar mas não adiantou a bola q estava na barriga dele estourou e lá vai eu pra mais um sofrimento aí até então ficou tudo normal eu já tinha me recuperado da segunda paulada q a vida tinha me dado em apenas um mês,que foi em março desse ano q meu terceiro gatinho o Inho apareceu com umas feridas no corpo q sangravam de mais e eu e minha mãe não sabíamos oq era estávamos cuidando como machucados colocamos iodo até q eu o levei ao Vet q foi quando descobri que ele já estava com espotricose super avançanda e q não tinha mais jeito e aí foi mais um sacrifício,até hj choro de saudades dos meus BBS pois eu não os tratava como bichos de estimação e sim filhos..nao eh fácil perder nosso companheirinho do dia a dia doe de mais..❤

    • Olá, Nara!

      Realmente não é fácil. O amor, carinho e dedicação que damos são os mesmos que temos com nossos semelhantes. Os animais são sim parte da nossa família e são um pouco parte da gente também.
      Sei que não é fácil seguir em frente, mas é preciso. Tenho certeza que você foi uma excelente mãe para eles e eles sabiam disso.
      Um abraço!

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